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O que o Rio Grande do Sul precisa fazer para se prevenir de catástrofes climáticas?

O que o Rio Grande do Sul precisa fazer para se prevenir de catástrofes climáticas?

O que o Rio Grande do Sul precisa fazer para se prevenir de catástrofes climáticas?

Redação Start

Especialistas falam sobre os motivos do poder público não ter se posicionado previamente para evitar a tragédia

Muitos internautas afirmam que houve negligência por parte do poder público, ao ter uma certa falta de planejamento urbano, descarte indevido de lixo, interferência humana e, principalmente, a falta de destinação correta de recurso público para medidas preventivas à esse tipo de desastre. Apesar de ser algo que causa revolta ao público e uma tristeza em massa para as pessoas que perderam os seus bens, parentes, animais e tiveram suas cidades completamente destruídas, muitas pesquisas têm mostrado que a população precisa estar preparada para eventos como esse, que serão cada vez mais frequentes como consequência das mudanças climáticas, com a ajuda e apoio do poder público.

O professor, pesquisador e ambientalista da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Marcelo Dutra da Silva, explica que a população do RS vem experimentando extremos climáticos de diferentes naturezas em que não estamos preparados, como ventos que superam a capacidade de tolerar, pancadas de granizo, estiagem severas e ciclones. Em uma análise histórica, ele dá o exemplo de que eventos como esse já vem acontecendo há vários anos, com muita intensidade, volume elevado e maior frequência.

Ele explica que isso acontece em linha e que nós estamos vivendo algo superior ao que vivemos em anos anteriores. Como exemplo podemos citar os eventos de ciclones e enchentes no sul do país em 2023. Segundo Marcelo, ao que tudo indica, nos meses de junho, julho e agosto, devemos experimentar uma virada de chave dos eventos climáticos causados pelo El Niño passando para o La Niña, que significa um período prolongado de estiagem.

Ele aponta que esses extremos têm previsão de afetar a população de uma forma impressionante, não somente devido às fortes tempestades e a necessidade de reconstrução, mas devido a necessidade de adaptação, além dos prejuízos econômicos causados. Marcelo destaca que diversas pesquisas reunidas nos relatórios do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas), apresentadas e debatidas nos diferentes fóruns internacionais, indicam que o clima está diferente e tudo indica que a humanidade tem forte participação nisso. Isso é resultado de uma economia baseada em carbono, práticas indevidas de uso e ocupação do solo, e transformação de espaços e recursos naturais.

Em uma avaliação técnica por parte da arquiteta, consultora em sustentabilidade, fundadora e CEO da Bgreen, Joana Giugliani, estamos vivendo um momento ambientalmente desafiador, consequência de práticas humanas que se estendem por décadas ou até séculos, culminando no desequilíbrio ambiental atual. Segundo ela, o ideal seria a criação de medidas preventivas suficientes, incluindo a implantação de políticas de adaptação às mudanças climáticas, o investimento em desenvolvimento sustentável e o constante monitoramento do impacto ambiental.

No entanto, além dessas iniciativas, há uma grande necessidade e esforço para que a população se adapte a uma nova realidade, a um futuro que inevitavelmente nos espera. Joana explica que os últimos eventos climáticos no Rio Grande do Sul evidenciaram algumas fragilidades e desafios históricos na sociedade e nas áreas urbanas que precisam ser urgentemente reavaliados. A falta de infraestrutura adequada, como estradas, abastecimento de água, saneamento e espaços abertos suficientes, contribuíram para intensificar o impacto sobre a população das áreas afetadas.

Além disso, ela reforça que a concentração de pessoas em áreas irregulares e suscetíveis a desastres naturais aumentou a vulnerabilidade dessas comunidades. Logo, ela entende que o governo, secretarias e prefeituras têm um papel fundamental na implementação de políticas públicas eficazes para prevenir catástrofes. Ela ressalta ainda que a região onde se encontram algumas das mais proeminentes faculdades de urbanismo do país está diante da oportunidade única de utilizar esse potencial para corrigir lacunas e deficiências no planejamento urbano das cidades.

Possíveis soluções

Em muitos casos e notícias, vemos surgir um conceito pouco conhecido pela massa da população, mas que tem ganhado destaque como uma das maneiras mais eficazes de evitar grandes enchentes como as que aconteceram no Estado no último mês, como o conceito de ‘cidades esponjas’. Com propriedade no assunto, Joana explica que as cidades esponjas são estruturadas para lidar com grandes volumes de água, capturando, retendo e infiltrando-a de forma eficiente.

Segundo ela, esse conceito é especialmente desenvolvido em áreas propensas a inundações e alagamentos, seja devido à alta densidade urbana ou à sua posição geográfica. Nesse contexto, as cidades podem se tornar mais responsivas à medida que aceitamos sua condição natural e sabiamente agimos a seu favor. Joana compartilha que existe uma série de medidas que podemos adotar para aproximar esse conceito da realidade brasileira e gaúcha.

“Uma das soluções é a integração de elementos naturais, como árvores, lagos e parques, no tecido urbano. Estas soluções naturais de gestão da água urbana não apenas são cerca de 50% mais econômicas do que as soluções artificiais, mas também são 28% mais eficazes, de acordo com estudos recentes. Além disso, o uso de ferramentas de mapeamento digital pode ser fundamental para ajudar as cidades a identificar rapidamente as melhores formas de utilizar seus espaços disponíveis. Isso inclui estratégias como a implementação de sistemas de coleta de água da chuva, a criação de lagoas e a promoção de jardins urbanos, que não só contribuem para a gestão da água, mas também promovem uma maior qualidade de vida”, comenta Joana.

Como exemplo de iniciativas bem-sucedidas, Joana compartilha que existem algumas que podem servir de inspiração para abordar desafios semelhantes no Rio Grande do Sul. Muitas dessas soluções são baseadas na natureza e podem ser complementadas por tecnologias inovadoras. Um exemplo citado é o projeto “Big U” implementado em Nova Iorque após o furacão Sandy, em 2012. Segundo ela, esse projeto incorpora infraestrutura verde, como áreas úmidas restauradas e jardins de chuva, para gerenciar o escoamento de águas pluviais e mitigar inundações, segmentando a cidade em diferentes zonas, cada uma com soluções específicas adaptadas às suas necessidades locais e características geográficas.

“Outra iniciativa inspiradora está localizada em Amsterdã, na Holanda, onde um conjunto de casas flutuantes foi projetado por Marlies Rohmer no Lago IJ. Essa ideia foi concebida para enfrentar a escassez de moradias e a vulnerabilidade às inundações, fornecendo uma solução inovadora para ambos os problemas. Em Copenhague, na Dinamarca, uma abordagem semelhante foi adotada com casas flutuantes para estudantes, feitas a partir de contêineres reciclados, projetadas pelo escritório de arquitetura ‘Urban Rigger’. Além dessas, há o movimento chamado Rewilding, que busca reintroduzir a natureza em ambientes urbanos, trazendo benefícios tanto para o meio ambiente quanto para os habitantes das cidades. Reconhecer e aprender com o passado muitas vezes é fundamental para encontrar soluções eficazes para os desafios do futuro”, compartilha Joana.

Já Marcelo afirma que há um certo deslumbre com o conceito, mas total desconhecimento em relação aos terrenos e paisagens em que muitos dos nossos municípios estão inseridos, sobretudo os que se encontram no entorno da Lagoa dos Patos, na Costa Doce, no litoral gaúcho. Ele explica que a própria estrutura de solos já são assim por natureza, e o que os pesquisadores têm feito é otimizar estudos recentes voltados para esse conceito com base em terrenos baixos, planos e úmidos que exercem esse papel de esponja.

Como exemplo, ele cita os banhados, que são responsáveis pela detenção de cinquenta vezes mais carbono do que uma floresta. O problema é que os banhados são apenas 2% das terras emersas do planeta. Porém, ele ressalta que os banhados e as áreas úmidas de diferentes fisionomias que recepcionam grandes volumes de água quando temos uma chuva local e, como consequência, evitando os alagamentos. Para ser eficiente em uma cidade, Marcelo explica que o ideal seria um sistema que conduza a drenagem pluvial para o interior de áreas como banhados, mais baixas, planas e úmidas.

Em uma explicação prática, o especialista afirma que os pulsos de inundação em volumes precipitados na região, que podem fazer com que os corpos hídricos do entorno se elevem, é para esses lugares que a água vai, ou seja, estas são áreas que são sempre consideradas sensíveis, vulneráveis e de alto risco e que jamais podem ser permitidas a ocupação. No entanto, não é o que acontece nos municípios, onde muitas áreas que deveriam ser desocupadas por riscos de inundação acabam sendo ocupadas pela falta de planejamento habitacional.

Como exemplo, cita a cidade de Pelotas, que é rodeada de áreas úmidas, terrenos que são vulneráveis, sensíveis e associados ao ambiente de margem. Apesar do planejamento habitacional ser um dos principais ativos para evitar grandes catástrofes, as políticas públicas têm andado na contramão dessa realidade, autorizando, licenciando e permitido construções. Marcelo aponta que os avanços pela cidade com grandes empreendimentos, condomínios, loteamentos e prédios têm comprometido a zona de escape, que deveria ser uma faixa de proteção de inundações, colocando boa parte agora da população de Pelotas em situação crítica de alto risco e muita atenção e, que obviamente, está neste momento invadida pelas águas.

Como recomendação, o especialista afirma que, com base em evidências encontradas dentro da ciência, o poder público não deveria mais em hipótese alguma autorizar empreendimentos que estejam destinados a áreas de risco por todo o Estado. Em casos de empreendimentos que ainda não começaram sua operação, Marcelo indica que sejam as áreas de construção e, se caso houver risco, que seja realocado para uma zona mais segura. Segundo ele, se há risco, mesmo que este município neste evento não tenha sido fortemente atingido, não quer dizer que em eventos futuros não venha a ser. Em análise, ele aponta que o período para a reconstrução pode levar em média 15 anos.

“Não dá mais para ficar fazendo tudo do mesmo jeito para perder tudo de novo, não dá para insistir no erro. A reconstrução tem que partir do princípio de que a gente pode vir a ser atingido de novo, e se isso é fato, e a ciência diz que é porque os eventos climáticos eles fazem. Agora, faz parte da nossa rotina e a gente tem que lidar com eles. Então, a gente precisa se adaptar, e esse se adaptar significa que vamos construir em áreas mais seguras, isso vale para a cidade mas também vale para as infraestruturas. No campo, nós precisamos orientar melhor as nossas práticas, investir mais em medidas de proteção das áreas de preservação permanente, estabelecimento da reserva legal e, claro, o uso de técnicas que sejam mais amigáveis no uso do solo. Então, práticas conservacionistas do uso do solo precisamos aportar menos sedimento dos corpos e precisamos aumentar a vegetação e não suprimir tanto a vegetação”, indica Marcelo.

Em uma análise da cidade de Porto Alegre, Marcelo comenta o caso das obras de contenção que foram realizadas na cidade e o maior exemplo disso é a construção do Muro de Mauá que, por um tempo, pode ter sido uma iniciativa eficiente. Porém, os eventos climáticos têm se intensificado e o planejamento de infraestrutura pública não se modernizou para acompanhar essas mudanças. E agora as comportas do Muro da Mauá não funcionaram para a sua única função, que seria conter o avanço das águas do Guaíba, porque a nossa referência era de muito tempo.

Joana aponta que o maior desafio nesse momento é planejar e agir simultaneamente. Em primeiro lugar, em uma escala macro, é crucial reconstruir a infraestrutura urbana. Esta reconstrução oferece oportunidades para abordar antigas questões, elevando os padrões de construção e repensando o uso do solo, com a integração de áreas verdes, jardins de chuva e a restauração dos ecossistemas de várzea. Segundo a arquiteta, outra frente de trabalho se concentra nas próprias estruturas construídas, que podem adotar aspectos adaptativos e de resiliência, como casas elevadas ou até construções flutuantes.

Além disso, ela reforça que todas as construções, mesmo aquelas não diretamente afetadas por enchentes e inundações, podem incorporar elementos que beneficiam o ecossistema urbano, como o aumento de áreas permeáveis e o uso de estruturas vivas, como telhados e paredes verdes. Essas soluções não apenas regulam as temperaturas, mas também purificam o ar e promovem a biodiversidade nos espaços urbanos.

“É importante relacionar a localização geográfica do Rio Grande do Sul com a situação climática extrema que enfrentamos, cada vez mais propensos a eventos de tempestades intensas e frequentes, conforme destacam os últimos relatórios do IPCC (Painel Intergovernamental para a Mudança Climática). Devemos também enfrentar o fato de que nosso clima já mudou de forma irrevogável. Nos ambientes urbanos, onde as superfícies impermeáveis, o escoamento da água é prejudicado, tornando-os inadequados para enfrentar as chuvas intensas. Portanto, uma medida que as cidades podem adotar é aumentar sua permeabilidade, permitindo que a água seja absorvida pelo solo de maneira natural”, aponta Joana.

Ela ressalta ainda que é essencial seguir uma abordagem integrada, com a colaboração de diversos stakeholders, promover a realização de avaliações criteriosas de riscos climáticos e vulnerabilidades para identificar as infraestruturas mais suscetíveis aos impactos das mudanças climáticas. Em seguida, ela enfatiza que é necessário integrar estratégias de resiliência climática no planejamento e design de novas infraestruturas, bem como na modernização das atuais.

Isso implicaria a atualização de normas e códigos de construção, além de recursos suficientes e mobilizar financiamento para projetos resilientes é fundamental. Algumas dessas abordagens incluem a melhoria da drenagem pluvial, uma “atualização” das construções para resistência a eventos extremos, planejamento urbano adaptativo e a implementação de tecnologias verdes, entre outras. Por fim, implementar sistemas de monitoramento possibilita acompanhar a eficácia das medidas e ajustar estratégias com base em novos dados e informações.

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